Preocupam-me as notícias que vêm da Europa. E mais preocupado fiquei depois de ler a entrevista que Luís Amado, ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, deu ao JN de hoje.
O projecto de tratado constitucional estancou após a rejeição do texto, em referendo, pela França e pela Holanda. Com a Europa amarrada numa complexa teia estrutural que impede o seu desenvolvimento, os Estados (todos?) esforçam-se por aprovarem um tratado em versão mini, tão mini que dispense a sua aprovação em referendo. O esforço feito, neste primeiro semestre, pela chanceler alemã, Ângela Merkel, é mais do que evidente e Portugal, à beira de assumir a presidência da União Europeia neste segundo semestre, prepara-se para seguir o mesmo caminho…
José Sócrates disse, e repetiu, que em Portugal haveria um referendo sobre esta matéria. Mas nos últimos meses temos ouvido os principais responsáveis pelo Governo de Portugal sugerirem que, se calhar, até é possível aprovar-se um tratado sem referendo. Hoje, o ministro Luís Amado rasgou o compromisso assumido com os portugueses de forma ainda mais clara: “Não faz sentido fazermos da ratificação por referendo uma bandeira, sabendo que outros estados-membros nossos associados estão a fazer da questão da ratificação parlamentar uma questão de bandeira para poderem aceitar um tratado que seja possível num consenso a 27”. Desconfio que esta fórmula de discurso será, muito em breve, repetida, repetida, repetida até à exaustão, pelo menos até os portugueses se esquecerem de que, em tempos, existiu um compromisso de referendo! E nessa altura, depois de termos fugido do referendo como o Diabo da cruz, talvez já se possa conhecer o conteúdo do tratado constitucional em versão mini…
A Europa em que vivemos é uma Europa de tratados, e os tratados são negociados pelos Estados. Mas uma Europa com regras constitucionais mínimas comuns não pode, em caso algum, limitar-se à negociação diplomática, aos corredores políticos opacos em que se movimentam e jogam inconfessáveis interesses políticos e económicos, não pode dispensar a consulta popular. Não pode.
Seria infinitamente mais limpo e transparente que Sócrates & Amado defendessem, por exemplo, um referendo, em simultâneo, em todos os 27, para que os europeus respondessem, “sim” ou “não”, a uma única, concreta e bem divulgada proposta de Constituição.
Paulo F. Silva
2 comentários:
Seja qual for a perspectiva agora defendida pelo governo Sócrates, sobre a Constituição Europeia ou a sua versão minimalista para Parlamentos, a posição do Bloco de Eszquerda deve continuar a ser a mesma ; exigir a ratificação via referendo nacional de qualquer texto mais ou menos constitucional, que retire mais fatias à capacidade de cada Estado membro ser minimamente autonomo .
Continuar a defender uma Europa dos Povos e não uma Europa de Estados.
Estas posições devem ser claramente assumidas em nome de um internacionalismo coerente, sem saudosismos isolacionistas, mas também sem subserviencias miserabilistas.
Ferreira dos Santos
Excelente ALERTA esta posta do Paulo Silva.
O governo Sócrates, como ftem feito com muitas outras questões, também sobre a Europa prepara-se para dar o dito pelo não dito. Ou seja, prepara-se para, a mando do Presidente Cavaco e de Durão Barroso, mandar às urtigas o referendo sobre um Tratado que, neste momento, NINGUÉM sabe o que é, como vai ser e quem o delineará.
É óbvio que deveremos continuar a EXIGIR um referendo. Mas também deveriamos EXIGIR um debate nacional e popular sobre a Europa que todos os europeus querem.
Qualquer tratado constitucional europeu que não seja o resultado do trabalho de uma Constituinte europeia eleita directa e universalmente por todos os europeu, deveria ser RECUSADO.
A Europa tem de ser o resultado da participação democrática e livre de todos os europeus e não o resultado da congeminação de comissões de burocratas não eleitos.
Seria também importante que as correntes de esquerda olhassem com maior atenção para uma matéria - a ideia de uma Europa unida - que foi originalmente tomada como uma das bandeiras da esquerda socialista no pós-guerra. É muito importante participar/intervir com posições socialistas em todos os fóruns europeus por mais atrofiada e deficitária que seja a prática democrática.
Não podemos dar tréguas ao liberalismo!
João Pedro Freire
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